Guga e Roland Garros – um caso de amor eterno

O caso é de amor mesmo. Entra ano e sai ano, e Guga continua sendo homenageado, lembrado, festejado em Roland Garros.
O dia 08 de junho marca os 20 anos da primeira conquista do brasileiro em Paris. As outras vieram no ano 2000 e 2001.
A cada ano a Federação Francesa de Tênis encontra um motivo para celebrar o brasileiro, o surfista do saibro que mudou para sempre o jeito de se jogar tênis no saibro e acima de tudo, de se conectar com o público.
Com cabelos encaracolados – desengonçados, andar leve, roupas coloridas, bandanas, uma serenidade fora do comum e um sorriso contagiante conquistou o público com sua simplicidade e garra natural.

Guga e Stan Smith, na coletiva de imprensa

A conexão estabelecida com o público o transformou em estrela na França. Até hoje tem patrocinadores franceses – Lacoste e Peugeot, vem frequentemente ao país e é celebrado até mais do que outros campeões com mais títulos do que ele.

Hoje em Paris não foi diferente.
Começou o dia com uma coletiva na sala de imprensa principal de Roland Garros. Que outro ex-campeão faz coletiva e encontra uma sala lotada às 11h, 4 horas antes dos jogos principais começarem?

E depois é levado para o Village, a área VIP de Roland Garros e é parado por Boris Becker, John McEnroe e Mats Wilander e homenageado dentro do “stand” da FFT.

Guga ganhou uma nova réplica da quadra com o desenho de um coração no vidro, ouviu um belo discurso de Guy Forget, recebeu os cumprimentos do Presidente da FFT atual, Bernard Giudiccelli e do antigo, Jean Gachassin, lembrou da sua equipe, da mãe que está com ele em Paris, do técnico Larri Passos e foi ainda agraciado com a presença do Braguinha (Antônio Carlos de Almeida Braga), com mobilidade bem limitada, que fez questão de passar por Roland Garros para cumprimentar o amigo.
Thomaz Koch também passou por lá para abraçar o compatriota.

Durante a tarde as aparições continuariam e no domingo, dia da final, antes da grande decisão masculina começar ele receberá o Anel do Hall of Fame, na Philippe Chatrier, acompanhado de outros grandes da história do esporte.

Veja abaixo alguns trechos da entrevista do brasileiro em Roland Garros, ao lado do também embaixador do Hall of Fame, Stan Smith:

As more the time goes away, after 20 years, I believe it’s a proper timing to analyze more deeply. You can see clear that is not one human being title or triumph. It’s many life involved. It’s a lot of efforts and
achievements that’s today I believe we celebrating the happening.

You know, it’s not only Guga that’s amazing guy. I’m sure it’s not coincidence that Diana is here. She was together with us and Larri and my mother that’s around here. What’s different now that I have two
sons? They can enjoy? I make sure they come over so they will be around today, too, for flavoring.
I believe what stick to us is the feelings, you know. The shots, they are there. We can see at the video. But the feelings, they remain with us forever

Actually, we come here to win one match, ’97.

One match was enough. I never had passed the second round in any Grand Slams. I had played three in all my life. So this was a kind of run you normally don’t see.
Still these days I can tell how it happens, just seeing the matches, analyze a little, but you cannot explain, you know, deeply.
But we were somehow prepared. We came here with a lot of desire on this way and very young. So we just, so funny. Was the happiest Roland Garros I played in my life. Also, because I didn’t know what all
this meaning.

’97, I start to discover new worlds or galaxy every single day.
Every match I face, from Bjorkman to Muster, then Medvedev, Kafelnikov, the semifinal against Dewulf, and finally getting Bruguera at the end, it’s like, Oh, man, this exists. I can be part of it.
Because as Brazilian, also sometimes for us it’s a different approach. Because tennis, now it’s more universal. But before it used to be more local successful, acquired by the United States or Europe,
Australia.
So for us as Brazilian, we dream of bigger ball. We have also believe we have success much more in soccer, but tennis was very hard to imagine.
And certainly getting here was trying also to prove myself that could happen to us. Nobody expects, even Larri that was the most optimist from all of us, expect us to go farther than the second week or fourth round, something like this, and it would be already celebrating time.
But at the same way, we were celebrating hard, very satisfied, but not accommodate every single round, which, why we don’t try a little bit more and see what happen?
Sometimes I told was perhaps my last chance. I didn’t have the truly, deeply belief that I was part of this great players. I just said — and even today, to listen, the players that we are there, the Hall of Fame,
that already received the ring, it’s very emotional to hear these words and to think like we are able to get to this select and privilege players to flavor this had happened.
So we, as it happened ’97, we came here to our playground to have fun, to discover
My grandmother arrive on the semifinal. She look around, she say,
Oh, it’s nice here. That’s how we dialogue with the French Open.
It’s the only chance I had, because if I knew a little bit deeper, it’s scary, as you know. First time I went to Court No. 1 and then Suzanne Lenglen and finally to the central court, it’s a world to try to control.
And the kids, 20-year-olds coming, you know, hair all around and the clothes. Now it’s better. Lacostehelped me a lot in this yellow and blue shirt, and this tennis player, Brazil, is no-sense story. But with a lot
of belief, I think this was the difference.
We really believe it was possible. That’s the only way
you are able to do it.

Diana Gabanyi

Foto de Cynthia Lum

Guga brilha no saibro francês e conquista Roland Garros pela primeira vez

Encontrei, fazendo uma busca no meu arquivo, o release que escrevi após a vitória do Guga em Roland Garros, naquele  08 de junho de 1997.

Da sala de imprensa escrevi o texto e distribuí por fax para todo o Brasil.

Da mesma sala de imprensa escrevo este texto hoje, 08 de junho de 2017.

Foi curioso ouvir o Guga repetir algumas das coisas que escrevi 20 anos atrás, ainda hoje. Durante coletiva na “sale de presse” de Roland Garros, Guga lembrou que nao estava pensando que era uma final de Grand Slam na época e o que isso significava.

Guy Forget, ex-jogador e hoje Diretor do Torneio de Roland Garros, comentou que se lembra do Guga brincando na sala de jogos dos juvenis, na quadra Suzanne Lenglen, um dia antes da final e não acreditava no que estava vendo. Pensou que não ia ser bom, mas foi e deu certo. O que Forget mais lembrou foi do brilho nos olhos do Guga que existiam em 1997 e existem até hoje.

Gustavo Kuerten brilhou na quadra central do templo sagrado do saibro, Roland Garros, e conquistou, hoje (domingo – 8/6/97), seu primeiro título de Grand Slam, ao arrasar o espanhol Sergi Bruguera, por 3 sets a 0, parciais de 6/3 6/4 6/2. Com a vitória Guga passa a ser o primeiro brasileiro a ganhar um torneio do Grand Slam e se colocará entre os vinte melhores jogadores do mundo, podendo ocupar até o 15o lugar na ATP.

O brasileiro esteve perfeito na partida de hoje (8/6/97). Jogou o seu melhor tênis. Fez apenas quatro aces, mas a porcentagem de pontos ganhos com o primeiro saque foi de 82%, enquanto que a do espanhol foi de 58%. O ponto mais bonito do jogo aconteceu no segundo game, do segundo set. Os dois trocaram várias bolas, de fundo e de rede e de todos os ângulos da quadra. Guga venceu o rally, digno de uma final de um torneio tão importante como este e comemorou como se tivesse vencido um set. Na terceira série, o torcedor do Avaí, quebrou o serviço do catalão no 6o. game e aí não permitiu mais a reação do adversário. “Só senti mesmo que poderia vencer no 5×2. Até então não estava acreditando que ganharia Roland Garros”, contou Guga, que fez a sua melhor partida do torneio, hoje. “Entrei em quadra muito confiante e acreditando em mim. Realmente joguei muito bem e todos as jogadas que tentei, deram certo” Nervosismo e apreensão por jogar a final de um Grand Slam não estiveram presentes na mente do tenista número um do Brasil, hoje. “Eu estava jogando partida por partida e fazendo o meu melhor a cada jogo. Nunca pensei, uau é a final de Roland Garros e tenho que vencer. Joguei como se fosse um treino, muito relaxado e curtindo bastante”, explicou.

Para ganhar o torneio de saibro mais importante do mundo Guga teve que vencer os últimos três campeões do torneio: Thomas Muster – 95 -, Yevgeny Kafelnikov – 96 -, Sergi Bruguera – 93, 94-. “Antes de sair do Brasil sabia que para vencer algumas rodadas aqui teria que me superar e acho que consegui fazer isso. Com certeza é o dia mais feliz da minha vida”, comemorou.

Guga recebeu o troféu das mãos de duas lendas do tênis mundial, que triunfaram em Roland Garros: Bjon Borg e Guillermo Villas. Antes de subir ao pódio para recer o pesado troféu, Guga limpou os pés e se curvou diante de Bjorg, seis vezes campeão deste torneio. “Foi uma grande emoção para mim receber o troféu destes ídolos do tênis. Eles são muito melhores do que eu, fizeram coisas incríveis para o tênis e tenho muito respeito por eles. São coisas novas para mim, essas de encontrar pessoas famosas e gostei muito.”

Ontem, o catarinense recebeu mais de trezentos fax de congratulações e incentivo, do Brasil inteiro, dentre eles, um de Pelé. No estádio de Roland Garros os torcedores brasileiros cantaram e tocaram um samba e por alguns minutos Guga participou da festinha. “É muito legal ver isso acontecendo com o tênis também. Normalmente a festa é para o futebol, mas tenho certeza de que hoje foi diferente e muitas pessoas no Brasil pararam para ver o meu jogo. Fico muito feliz”, agradeceu Guga.

A comemoração do título acontece hoje (domingo – 8/6/97) à noite, com a família e os amigos, num hotel de Paris.

Amanhã à tarde Guga e o técnico Larri Passos embaracam para Bologna, na Itália, onde o tenista disputa o ATP Tour local, no saibro. Na estréia, na terça-feira, ele enfrentará o argentino Marcelo Charpentier.

A foto eu mesma tirei!

Diana Gabanyi

Especial Guga97 – Na era do Fax

Difícil de imaginar neste mundo completamente digital que 20 anos atrás a nossa comunicação era feita por fax, por telefonemas de telefone fixo – ninguém viajava com celular e uma ligação internacional era caríssima.

Nestes tempos de comemoração dos 20 anos do primeiro título do Guga em Roland Garros, foram várias entrevistas que acabaram fazendo a gente refletir, lembrar momentos marcantes e pensar como era a vida naquela época.

Outro dia me perguntaram como eu acompanhava os resultados, já que não se transmitia Grand Slam como hoje em dia, desde a primeira rodada e um dia todo de jogos, de manhã até de noite, com direito a programa especial no fim da jornada, como o Ace BandSports ou o Pelas Quadras da ESPN.

E eu não soube responder. Depois fui perguntar em casa e para o Paulo Carvalho, empresário do Guga praticamente até o fim da carreira. E chegamos a conclusão que esperávamos o Larri ou o Guga ligar; ou entrar algum flash na televisão – das quartas-de-final pra frente todos os jogos foram transmitidos ao vivo. Lembro até do Chiquinho Leite Moreira me ligando empolgadíssimo de Paris para me contar as novidades.

Das quartas em diante eu já estava lá.

Mesmo assim, até chegar o contato com o Guga e o Larri era feito via telefone do Hotel Mont Blanc. Depois eu escrevia o release e distribuía por fax para as redações de jornais. Os jornalistas que queriam falar comigo, enquanto estava no Brasil, me ligavam. Depois que eu cheguei em Paris praticamente virei a telefonista do Hotel Mont Blanc, atendendo todos os telefonemas (99% era de gente atrás do Guga), ou falavam comigo em Roland Garros.

Era uma era diferente. Para dar alguma informação eu tinha que passar um fax ou atender o telefone. E eram  umas 200 ligações por dia, sem exageros. Só depois passamos a viajar com internet discada e a distribuir releases por email.

Nesta entrevista em vídeo para a Revista Veja dá para ter uma boa noção como 20 anos tecnologicamente falando fizeram uma revolução no método de se comunicar.

Diana Gabanyi

 

Especial Guga97 – A vitória sobre o Muster, quando tudo mudou

Aquele Roland Garros já era diferente. O Guga já estava na terceira rodada, o que era o seu melhor resultado em um Grand Slam. O adversário era difícil, o campeão de Roland Garros 1995, o homem de ferro do saibro, Thomas Muster.

O jogo foi uma montanha russa. O austríaco ganhou o primeiro set por 7/6, Guga o segundo por 6/1, venceu o 3o. por 6/3, aí perdeu o quarto por 6/3 e o Muster abriu 3/0 no 5o. set. Estava quase tudo perdido. Mas, algo maior estava por vir. Guga conseguiu virar o placar e vencer o set e o jogo por 6/4. (6/7 (3/7), 6/1, 6/3, 3/6 e 6/4)

Estava assistindo esses dias os melhores momentos da partida e confesso que não lembrava de muita coisa, apenas das cenas finais que nos acostumamos a ver nestas duas décadas. Mas que jogaço, cada ponto, cada certinha, que emoção.

Dali para frente nada mais foi igual.

A loucura começou – pelo menos para mim. Telefonemas, pedidos de informações, uma inquietação, o mundo do tênis no país em polvorosa.

E era apenas o começo. Foi talvez o primeiro dia dos 11 anos que se seguiram até o Guga se aposentar em que a minha vida de assessora nunca mais foi a mesma.

Diana Gabanyi

#Guga97 – A chave

#Guga97

Quando Roland Garros 1997 a expectativa era de um bom resultado para o Guga. Chegar a uma terceira rodada, quem sabe a uma segunda semana seria extraordinário.
Ganhar o torneio? Ninguém imaginava.

Especialmente quando saiu a chave e havia 3 campeões de Roland Garros no meio do caminho.


Thomas Muster, Yevgeny Kafelnikov e Sergi Bruguera.

Guga acabaria vencendo os três.

Não eram só os 3 campeões de Grand Slam que estavam no caminho dele. O cabeça de chave 1 naquele ano era Pete Sampras; o segundo pré-classificado, Michael Chang, outro ex-campeão. Ainda na lista dos cabeças – 16 apenas na época, Rios, Correjta e Moya, todos bem mais ranqueados que o Guga na época.

Veja a chave completa de Roland Garros 1997 aqui

Diana Gabanyi

Guga – especial 20 anos de Roland Garros

Hoje, dia 26 de maio marca 20 anos do início de uma trajetória que mudaria para sempre a história do tênis no Brasil. Gustavo Kuerten vencia o primeiro de sete jogos para conquistar Roland Garros. Vencia o checo Slava Dosedel, por 6/0 7/5 6/1,o adversário que sempre lhe causava problemas.

Tennis View acompanhou de perto todas as conquistas do Guga em Paris e vai fazer um especial para marcar as duas décadas do momento histórico.

Vamos publicar um texto por dia, até o dia 08 de junho para relembrarmos a história.

Há 20 anos Guga transformava para sempre o tênis no Brasil.

Por ser disputado no saibro e, claro, ser um Grand Slam, Roland Garros sempre teve destaque especial no calendário dos tenistas da América Latina. Mas, desde o dia 8 de junho de 1997, a relação dos brasileiros e dos latino-americanos com Roland Garros nunca mais foi a mesma: transformouse em um caso de amor.

Foi nesse dia 8 que Gustavo Kuerten, aos 20 anos de idade, um tenista de Santa Catarina, então 66º colocado no ranking mundial, conquistava o que viria a ser o primeiro de seus três títulos em Paris.

Uma conquista que parecia inimaginável para o tênis do Brasil e também da América Latina. Na época, eram apenas cinco latinos entre os top 100 da ATP (Marcelo Rios era o 10º; Marcelo Fillipini, o 53º; Hernan Gumy, o 64º; Guga, o 66º; e Meligeni, o 88º).
Como sonhar em ganhar um Grand Slam, em um momento em que o tênis era dominado por Pete Sampras, Michael Chang, Goran Ivanisevic, Thomas Muster, Yevgeny Kafelnikov, Carlos Moyá e Alex Corretja, entre outros grandes?
Como acreditar que um brasileiro, que nunca havia vencido um torneio ATP e, uma semana antes de Roland Garros começar, ganhara um torneio Challenger, em Curitiba, poderia terminar a quinzena em Paris recebendo a “Coupe des Mousquetaires” das mãos de Bjorn Borg?
Como pensar que um jogador do Brasil, um país que havia alcançado com Thomaz Koch, no máximo, as quartas-de-final de torneios do Grand Slam, e do qual só se ouvia falar, ocasionalmente, pelas conquistas da “bailarina” Maria Esther Bueno, num passado distante, pudesse triunfar no mais extenuante dos Grand Slams?
Como imaginar que o menino do sorriso contagiante, andar desengonçado, hóspede do simples hotel Mont Blanc, e que, aos 15 anos de idade, levado a Roland Garros pela primeira vez por seu técnico Larri Passos se escondia nas arquibancadas para poder assistir a todos os jogos, conseguiria vencer os três últimos campeões de Paris (Muster, Kafelnikov e Sergi Bruguera) para triunfar?

Como vislumbrar uma conquista que tinha como desafios superar Slava Dosedel; Jonas Bjorkman, então 23º colocado no ranking mundial; Thomas Muster, o quinto do mundo na época, e depois de estar perdendo o quinto set por 3×0; Andrei Medvedev, o ucraniano 20º do ranking, mais jovem campeão do Masters Series de Hamburgo, em uma partida interrompida no meio, em que o adversário liderava o placar; Yevgeny Kafelnikov, o defensor do título em 1997; Filip Dewulf, o belga que veio do qualifying; e, por fim, o bicampeão, o espanhol Sergi Bruguera?
Como eles fizeram?
Gustavo Kuerten e Larri Passos acreditaram que podiam e foram, jogo a jogo, acreditando ainda mais, até chegarem à final para arrasar Bruguera por 6/3 6/4 6/2 e transformar, para sempre, a história do tênis no Brasil e na América Latina.

Como imaginar o tênis do Brasil, há mais de 10 anos? O tênis do Brasil antes da primeira das conquistas de Guga em Paris?

Talvez o País não tenha visto surgir outros grandes nomes, outros campeões de Grand Slam, outros top 10, top 20, como se chegou a imaginar que aconteceria, mas o efeito do triunfo de Guga é tanto e tão importante que é difícil avaliá-lo.

Roland Garros Há 10 anos, Guga transformava, para sempre,
o tênis no Brasil.

Diana Gabanyi

Texto publicado originalmente (e atualizado) na edição 81 da Revista Tennis View